no último dia do ano

No 365.º dia do ano de 2019, calendário gregoriano, assinala-se o último dia do ano, antecedendo o Dia de Ano Novo. Que é, também, início de uma nova década no século XXI.

Pode ser um dia de balanço do ano que termina, relembrando os momentos bons e nem tanto, assim como os acontecimentos mais relevantes, seja a nível pessoal ou profissional, nacional ou internacional.

Também costuma ser dia para preparar as “resoluções de ano novo“, para cumprir ao longo do novo ano e que, frequentemente, não sobrevivem ao primeiro mês.

A tradição de resoluções de Ano-Novo remonta aos babilónios, que faziam promessas aos deuses no início de cada ano e também eram comuns na Roma de Júlio César e no início do Cristianismo. Várias pesquisas revelam que se desiste das resoluções de Ano-Novo em menos de um mês e as mais comuns são comer melhor, fazer mais exercício, gastar menos dinheiro e dormir mais. Salvo exceções (à volta dos 10 ou 12% que cumprem), estas resoluções de Ano Novo servem para pouco.

Neste último dia do ano assinalam-se algumas efemérides:

  • os vândalos cruzaram o Reno para invadir a Gália (486),
  • os primeiros huguenotes partiram da França para o Cabo da Boa Esperança (1687),
  • deu-se a Batalha do Quebec na Guerra da Independência dos Estados Unidos (1775),
  • Thomas Edison demonstrou pela primeira vez a lâmpada incandescente ao público, em Menlo Park, Nova Jersey (1944),
  • começou a Operação Nordwind na Frente Ocidental (1944),
  • Harry S. Truman proclamou oficialmente o fim das hostilidades na Segunda Guerra Mundial (1946),
  • voou o primeiro avião comercial supersónico do mundo: o Tupolev Tu-144 (1968),
  • encerraram-se as operações das instituições oficiais da União Soviética, dissolvida foi cinco dias antes (1991),
  • foi inaugurado o Taipei 101, o arranha-céu mais alto da época no mundo, com 509 metros de altura (2004).
  • o nascimento de Jacques Cartier (1491), de Silvestre Pinheiro Ferreira (1769), de Henri Matisse (1869),  de George Marshall (1880);
  • a morte de Commodus (192), Robert Boyle (1691), Miguel de Unamuno (1936), Marshall McLuhan (1989).

 

Nascido do dia: Emmanuel Lévinas

Emmanuel Levinas nasceu em Kaunas, na Lituânia, a 30 de dezembro de 1905 / 12 janeiro de 1906 (conforme os calendários juliano ou gregoriano) e morreu, em Paris, a 25 de dezembro de 1995. Nascido no seio de uma família judaica, o pai era livreiro, e Lévinas cedo teve contato com os clássicos da literatura russa, como Dostoiévski, que é muito citado nas suas obras.  Aos doze anos, na Ucrânia, assistiu à revolução de Outubro (1917). Mais tarde, estabeleceu-se em França e em 1923 estudou Filosofia na Universidade de Estrasburgo e contactou com Charles Blondel, Maurice Halbwachs, Maurice Pradines e Henri Carteron.  Em 1928 foi para Freiburg e prosseguiu estudos com Husserl, encontrando Heidegger. Em 1929, apresenta sua tese de doutoramento sobre La Théorie de l’Intuition dans la Phénoménologie de Husserl (1930).  Bastante influenciado pela fenomenologia de Husserl, assim como pelas obras de Martin Heidegger, Franz Rosenzweig e Monsieur Chouchani, o pensamento de Lévinas parte da ideia de que a Ética, e não a Ontologia, é a Filosofia primeira. É no face-a-face humano que se irrompe todo sentido. Diante do rosto do Outro, o sujeito se descobre responsável e lhe vem à ideia o Infinito.

Regressou a Paris até que, tendo eclodido a II Guerra Mundial (1939), foi capturado e feito prisioneiro pelos alemães. Exilado cinco anos, escreve grande parte de sua obra De l’Existence à l’Existant (1947), publicada dois anos após o fim da guerra. Durante dezoito anos (1946-1964), dedicou-se à direção da Escola Normal Israelita Oriental de Paris. Nesse período, publicou a grande obra Totalité et Infini (1961). Difficile Liberté (1963) apareceu dois anos depois, com foco em questões sobre o judaísmo. Lecionou depois na universidade de Poitiers (1964-1967), na de Paris-Nanterre (1967-1973) e na de Paris-Sorbone (1973-1984). Faleceu em Paris em dezembro de 1995.

Podemos mostrar-nos escandalizados por esta concepção utópica e, para um eu, inumana. Mas a humanidade do humano — a verdadeira vida — está ausente. A humanidade no ser histórico e objetivo, a própria aberta do subjetivo, do psiquismo humano, na sua original vigilância ou acalmia, é o ser que se desfaz da sua condição de ser: o des-inter-esse. É o que quer dizer o título do livro: ‘de outro modo que ser’. A condição ontológica desfaz-se, ou é desfeita, na condição ou incondição humana. Ser humano significa: viver como se não se fosse um ser entre os seres. Como se, pela espiritualidade humana, se invertessem as categorias do ser, num ‘de outro modo que ser’. Não apenas num ‘ser de modo diferente’; ser diferente é ainda ser. O ‘de outro modo que ser’, na verdade, não tem verbo que designe o acontecimento da sua in-quietude, do seu des-inter-esse, da impugnação deste ser — ou do esse — do ente. (…) De fato, trata-se de afirmar a própria identidade do eu humano a partir da responsabilidade, isto é, a partir da posição ou da de-posição do eu soberano na consciência de si, deposição que é precisamente a sua responsabilidade por outrem. (…) Tal é a minha identidade inalienável de sujeito .” LEVINAS, E. Ética e Infinito: diálogos com Philippe Nemo. Trad. João Gama. Lisboa: Edições 70, 1988, p.92-93

Cf.

Emmanuel Levinas e a Obsessão do Outro

Lévinas e a sensibilidade como comunicação originária

Lévinas e Derrida

O problema do humano em Emmanuel Lévinas

Thinking about Death II: Lévinas

Emmanuel Levinas© Photographed by Bracha Ettinger

em época de reflexão, um saltinho ao retiro de Wittgenstein

Ludwig Wittgenstein in SkjoldenThe sociocultural ecology of a way of doing philosophy

«I can’t imagine that I could have worked anywhere as I do here. It’s the quiet and, perhaps, the wonderful scenery; I mean its quiet seriousness.» (LW, 1936)

The immediate context of these famous sentences:  The philosopher Ludwig Wittgenstein are writing these words in a letter while staying in his mountain cabin in Skjolden the autumn of the year 1936. The enigmatic 47-year-old philosopher, grown up in wealthy family surroundings in the cultural center of Austria’s Vienna, has once more withdrawn geographically to a tiny western norwegian village among steep mountains in the bottom of an almost endless fjord. Janik and Toulmin, in their pioneering work about ‘Wittgenstein’s Vienna’ (1973), are sketching a basic formula for most approaches to this philosopher ;

» Wittgenstein was also a remarkable man who grew up in a remarkable milieu.»

«When I was in Norway during the year 1913–1914 I had some thoughts of my own, or so at least it seems to me now. I mean I have the impression that at the time I brought to life new movements in thinking (but perhaps I am mistaken). Whereas now I seem just to apply old ones.» (Wittgenstein, 1980, Culture and Value).

Ou, nouto texto, de Alberto Ruiz de Samaniego

Pero, en la cabaña – ese otro castillo encantado- , hablamos de alguien al fin redimido, apartado, en la visión, por la visión misma. Alguien milagrosamente librado antes que nada de sí. En la medida en que, como ya sugirió Merleau-Ponty, “la visión no es cierto modo del pensamiento o presencia a sí mismo: es el medio que me es dado para estar ausente de mí mismo” (El ojo y el espíritu). Y hablamos de milagro porque ese individuo des-personalizado, alguien que ha perdido felizmente el rostro, habrá de ser entonces capaz de atender y hasta fundirse con el proceso mismo de salvaje inmanencia en que la vida se hace y deshace continuamente, en su fondo y lejanía primordiales. En lo que es simple y plenamente, como en una universal y fiable visibilidad.

Y entonces, cuando las palabras ya no explican nada, o allí donde no pueden decir nada, los ojos adquieren una penetración singularísima. Quizás no se haya pensado suficientemente la importancia de la visualidad en las meditaciones de Wittgenstein. Por ejemplo, el 11 de junio de 1916, todavía en el frente de guerra, se plantea la siguiente cuestión: “¿Qué sé de Dios y del propósito de la vida?”, y él mismo se responde con una serie de tanteos, de los que seleccionamos algunos muy significativos: “Sé que este mundo existe. Que estoy emplazado en él al igual que mi ojo en su campo visual. Algo acerca de su problemática, que llamo su sentido. Que su sentido no reside en él sino fuera de él. (…) Sólo puedo volverme independiente del mundo – y en cierto sentido dominarlo- renunciando a cualquier influencia en los acontecimientos.” Toda esta preocupación por la visualidad se trasladará al Tractatus. De hecho, he ahí lo que Wittgenstein considera la visión mística del mundo: su visión como totalidad delimitada (Tractatus, 6.45)

Nascido do dia: Julien Benda

Julien Benda nasceu em Paris, a 26 de Dezembro de 1867 e morreu a 7 de Junho de 1956. Crítico, escritor e filósofo francês, celebrizado pela obra La Trahison des clercs (A Traição dos Clérigos ou, em alternativa, A Traição dos Intelectuais), de 1927.

«A traição dos clérigos é a recusa dos valores universais e a sujeição do espiritual ao temporal.» Seriam então os «clérigos», na opinião de Benda, forçados a escolher entre contemplação e acção? O autor fora, de facto, bem explícito: «O clérigo deve dar a sua adesão ao ideal de esquerda, à metafísica de esquerda, mas não necessariamente à política de esquerda. A função do intelectual em matéria política é pregar o respeito pela justiça e pela verdade.» (…) «O clérigo não é forte senão se declara aos homens que o seu reino não é deste mundo…» (…) «O clérigo é crucificado mas a sua palavra obceca a memória dos homens.» Serão necessários exemplos? Sócrates e Jesus Cristo.René Étiemble, no prefácio que assinou trinta anos depois da edição original desta obra de Julien Benda, enumerava algumas «capelas» que o autor tanto parece ter perturbado: a bergsonista, a maurrasiana, a surrealista e a existencialista, interrogando: «Com uma só obra, porquê ter conquistado alguns milhares de inimigos: todos os clérigos que tinham traído, ou seja, quase todos os clérigos?» (fonte aqui)

Originário de família judaica, Julien Benda ficou à frente da empresa de exportação familiar até à falência desta em 1913, devendo a partir de então sobreviver da sua escrita. Na filosofia, foi crítico das ideias de Bergson em várias obras, a primeira das quais Le Bergsonisme ou Une philosophie de la mobilité (1912), baseando-se nos argumentos de Descartes e Espinosa.

Politicamente, muito difícil de rotular.  Foi crítico da autoritária Action française, do fascismo e do nazismo. Conservador no plano estético e considerado “anti-moderno”, Benda foi um teórico da independência política e da neutralidade partidária dos intelectuais. Na sua opinião, os homens de espírito, ou clérigos, termo com que pretendeu acentuar a sua nobre missão ou clericatura (clericato), deveriam preocupar-se acima de tudo com a defesa dos valores eternos, abstractos e universais da verdade, justiça e liberdade, recusando a tentação laica das paixões de nação, raça, classe ou religião, isto é, o nacionalismo, o marxismo, o racismo, o nacionalismo judaico, a xenofobia e o militarismo. Perante as realidades da injustiça, da mentira e da opressão, o intelectual tinha o dever de descer à praça pública para tomar posição intransigente em defesa, exclusivamente, dos valores eternos e universais quando ameaçados.

Caracteriza a natureza das paixões políticas como provenientes de duas vontades fundamentais:

  • Vontade que busca a satisfação de um interesse: esse primeiro tipo de vontade constitui o desejo, partilhado por um grupo de homens, de obter ou, se já o têm, de conservar determinado bem temporal, sejam territórios, conforto material ou o próprio poder político, com as vantagens temporais que este comporta.
  • Vontade que busca a satisfação de um orgulho: corresponde a um desejo partilhado por um grupo de homens, porém relacionado a sentirem-se distintos de outros homens.

Ambas as vontades entram nas paixões políticas segundo diferentes tipos de relações, a depender da paixão considerada. Importante é notar que a paixão nacional obteve a reunião desses dois fatores, desejando o patriota, ao mesmo tempo, possuir um bem temporal e afirmar-se como distinto. Tal distinção seria o segredo de sua evidente superioridade e força com relação às demais paixões.Para Julien Benda, as paixões políticas seriam essencialmente paixões realistas. Tal posição justifica-se com o argumento de que ambas as vontades, que buscam a satisfação de um interesse ou de um orgulho, seriam componentes essenciais da vontade do homem “afirmar-se na existência real”.

“Benda is one of those figures who are more often invoked than examined. There are only two major studies of Benda in English, a literary analysis by Robert J. Niess, Julien Benda (1956), and a cultural/political analysis by Ray Nichols, Treason, Tradition, and the Intellectual (1978). Both works have extensive bibliographies which detail short pieces on Benda by such figures as T. S. Elliot. One of Benda’s articles (on French democracy and the Nazi threat) is translated in Justin O’Brien (editor), NRF: The Most Significant Writings from the Nouvelle Revue Francaise, 1919-1940 (1958). Selections from Benda’s Trahison appear in M. Curtis (editor), The Nature of Politics (1963), and in G. B. de Huszar (editor), The Intellectuals (1960). There have been full English translations of Benda’s Trahison (1928, reissued 1955) and Belphegor (1920)” aqui

“Julien Benda passa l’Occupation en zone sud : il fut à Carcassonne en août 1940, à Quillan dans l’Aude en mars 1941, et à Toulouse en mai 1944. Alors qu’il était mis à l’index par les listes Bernhard et Otto, les Allemands confisquèrent ses papiers et sa bibliothèque parisienne. Aidé par le Parti communiste pendant la guerre (via Andrée Viollis* selon G. Sapiro), il fut aussi en contact avec Jean Paulhan : c’est en grande partie par ce dernier que passèrent ses publications hors de France (La Grande épreuve des démocraties à New-York en 1942 et les textes donnés en Suisse à Confluence) ou clandestines sous le pseudonyme de Comminges (Le Rapport d’Uriel et Un antisémite sincère). Membre du Comité national des écrivains (CNE) de la zone sud et collaborateur des Étoiles, il écrivit aussi à la Libération dans le Patriote du Sud-Ouest, l’organe du Front national à Toulouse, à partir de septembre 1944. Après la guerre, il retrouva la posture qui était la sienne dans les années trente : ce compagnon de route anti-marxiste (et anti-existentialiste comme il avait été anti-bergsonien) retrouva sa tribune de L’Ordre en même temps qu’il collaborait aux Lettres françaises.”(aqui)

«In 1927 the French philosopher Julien Benda published a piercing attack on the intellectuals of his day. They should, he argued in La Trahison des Clercs (the treason of the scholars) act as a check on popular passions(1). Civilisation, he claimed, is possible only if intellectuals stand in opposition to the demands of political “realism” by upholding universal principles. “Thanks to the scholars,” Benda maintained, “humanity did evil for two thousand years, but honoured good.” Europe might have been lying in the gutter, but it was looking at the stars.

But those ideals, he argued, had been lost. Europe was now lying in the gutter, looking in the gutter. The “immense majority” of intellectuals, artists and clergy had joined “the chorus of hatreds”: nationalism, racism, the worship of power and war. In doing so, they justified and magnified political passions. Across Europe, scholars on both the left and the right had become “ready to support in their own countries the most flagrant injustices”, to abandon universal principles in favour of national exceptionalism and to proclaim “the supreme morality of violence”. He quoted the French anarcho-syndicalist Georges Sorel, who eulogised “the superb blond beast wandering in search of prey and carnage”.

The result of this intellectual support for domination, Benda argued, was that there was now no moral check on the pursuit of self-interest. Rather than forming a bulwark against popular delusions, Europe’s thinkers turned them into doctrines. With remarkable foresight, he predicted that this would lead inexorably to “the greatest and most perfect war ever seen in the world”. This war would be genocidal in intent(2), and would not be stopped by any treaties or institutions. In 1927 these were bold claims.» (fonte aqui)

No final da vida, com mais de 80 anos, Benda traiu os princípios que ele próprio propagandeara, tornando-se um apoiante da União Soviética de Stalin e dos processos políticos forjados contra opositores condenados à morte.

  • Dialogues à Byzance, La Revue blanche, 1900
  • Mon premier testament, Cahiers de la Quinzaine, 1910
  • Dialogue d’Eleuthère, Cahiers de la Quinzaine, 1911
  • L’Ordination, Cahiers de la Quinzaine, 1911
  • Le Bergsonisme, ou Une philosophie de la mobilité, Mercure de France, 1912
  • Une philosophie pathétique, Cahiers de la Quinzaine, 1913
  • Sur le succès du bergsonisme. Précédé d’une Réponse aux défenseurs de la doctrine’, Mercure de France, 1914
  • Les Sentiments de Critias, Emile-Paul frères, 1917
  • Belphégor : essai sur l’esthétique de la présente société française, Emile-Paul frères, 1918
  • Les Amorandes, Emile-Paul frères, 1921
  • Le Bouquet de Glycère, trois dialogues, Emile-Paul frères, 1921
  • La Croix de roses ; précédé d’un dialogue d’Eleuthère avec l’auteur, Grasset, 1923
  • Billets de Sirius, Le Divan, 1925
  • Lettres à Mélisande pour son éducation philosophique, Le livre, 1925
  • Pour les vieux garçons, Emile-Paul frères, 1926
  • La Trahison des clercs, Grasset, 1927 (A Traição dos Intelectuais)
  • Les Amants de Tibur, Grasset, 1928
  • Cléanthis ou Du beau et de l’actuel, Grasset, 1928
  • Properce, ou, Les amants de Tibur’, Grasset, 1928
  • Supplément à De l’esprit de faction de Saint-Evremond, éditions du Trianon, 1929
  • Appositions, Nouvelle Revue Française, 1930
  • Esquisse d’une histoire des Français dans leur volonté d’être une nation, Gallimard, 1932
  • Discours à la nation européenne, Gallimard, 1933
  • La jeunesse d’un clerc, Gallimard, 1936
  • Précision (1930-1937), Gallimard, 1937
  • Un régulier dans le siècle, Gallimard, 1938
  • La grande épreuve des démocraties : essai sur les principes démocratiques : leur nature, leur histoire, leur valeur philosophique, Éditions de La Maison Française, 1942
  • Un Antisémite sincère, Comité National des écrivains, 1944
  • La France byzantine, ou, Le triomphe de la littérature pure : Mallarmé, Gide, Proust, Valéry, Alain Giraudoux, Suarès, les Surréalistes : essai d’une psychologie originelle du littérateur, Gallimard, 1945
  • Exercice d’un enterré vif, juin 1940-août 1944, Éditions des Trois Collines, 1945
  • Du Poétique selon l’humanité, non selon les poètes, Editions des Trois Collines, 1946
  • Non possumus. À propos d’une certaine poésie moderne, Editions de la Nouvelle Revue Critique, 1946
  • Le rapport d’Uriel, Flammarion, 1946
  • Tradition de l’existentialisme, ou, Les philosophies de la vie, Grasset 1947
  • Trois idoles romantiques : le dynamisme, l’existentialisme, la dialectique matérialiste, Mont-Blanc, 1948
  • Du style d’idées : réflexions sur la pensée, sa nature, ses réalisations, sa valeur morale, Gallimard, 1948
  • Deux croisades pour la paix juridique et sentimentale, Editions du Temple, 1948
  • Songe d’Éleuthère, Grasset, 1949
  • Les cahiers d’un clerc, 1936-1949, Emile-Paul frères, 1950
  • De Quelques constantes de l’esprit humain, critique du mobilisme contemporain, Bergson, Brunschvieg, Boutroux, Le Roy, Bachelard, Rougier, Gallimard, 1950
  • Mémoires d’infra-tombe, Juillard, 1952

 

Ladainha dos Póstumos Natais. David Mourão-Ferreira

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito

David Mourão-Ferreira, in ‘Cancioneiro de Natal’

Natal é quando um homem quiser

Tu que dormes a noite na calçada de relento
Numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
Tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que dormes só no pesadelo do ciúme
Numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
E sofres o Natal da solidão sem um queixume
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
Tu que inventas bonecas e combóios de luar
E mentes ao teu filho por não os poderes comprar
És meu irmão amigo
És meu irmão

E tu que vês na montra a tua fome que eu não sei
Fatias de tristeza em cada alegre bolo-rei
Pões um sabor amargo em cada doce que eu comprei
És meu irmão amigo
És meu irmão

Natal é em Dezembro
Mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
É quando um homem quiser
Natal é quando nasce uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto que há no ventre da Mulher

 Ary dos Santos, in ‘As Palavras das Cantigas’