da diversidade europeia quanto ao final de vida

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retomando uma ideia mais antiga sempre presente,

temos ideia da diversidade, na Europa, no que diz respeito, por exemplo, a decisões face ao final de vida?

A expressão da vontade antecipada (advance health care directives, living will, testamento vital) está consagrada em vários países.

Em Espanha, a Ley 41/2002, de 14 de Novembro sobre a autonomia do doente e de direitos e obrigações em matéria de informação e documentação clínica, dedica o artigo 11º às “instrucciones previas”. Instituído para ser redigido por uma pessoa maior de idade e capaz, o documento de instruções prévias pode, para além da definição dos cuidados de saúde a que quer ser submetida, ser uma forma da pessoa deixar expressa a sua vontade sobre o seu corpo após a morte, nomeadamente sobre os seus órgãos.

Em França, foi publicada a “Loi nº 2005-370 du 22 avril 2005 relative aux droits dês malades et à la fin de vie” relacionada com os direitos dos doentes e o fim de vida, estando legislada a possibilidade de uma pessoa de maior idade redigir directivas antecipadas relativamente à limitação ou à cessação de cuidados em fim de vida.

Em Itália, o Comitato Nazionale per la Bioetica, em 2003, recomendou algumas condições para ser considerada válida a indicação expressa no documento “dichiarazioni anticipate di trattamento”.

Na Holanda e na Bélgica, a eutanásia está legalmente definida bem como a expressão antecipada da vontade.

Em Portugal, muito por discutir, apesar das Guidelines recentemente propostas da Associação Portuguesa de Bioética ou, noutro sentido, o caso trazido a público pela SIC acerca de uma menina em estado vegetativo persistente.

Este é outro dos assuntos que a todos interessa, que também se inscreve na moral social e na expressão participativa de uma cidadania esclarecida.

(imagem aqui)

Pensamento do dia

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“Todo o ser humano é diferente de mim e único no universo; não sou eu, por conseguinte, quem tem de reflectir por ele, não sou eu quem sabe o que é melhor para ele, não sou eu quem tem de lhe traçar o caminho; com ele só tenho o direito, que é ao mesmo tempo um dever: o de o ajudar a ser ele próprio.”

Agostinho da Silva

ser(es) humano(s)

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A experiência da contingência radical é fundante da vida humana: nada nos garante, de antemão, que as possibilidades se efectivem.

O ser humano é, inevitavelmente, ser de decisões: toda a nossa vida é uma sequência de decisões, em que nos pomos diante de alternativas diversas e  optamos. Não estamos presos a um instinto, nem plenamente determinados. Actuamos num espaço em aberto pelo que a primeira tarefa da vida pode bem ser a tarefa de construção de si mesmo. Ou seja, de se autoconfigurar no mundo, entre os Outros e com os Outros, nas diferentes possibilidades da autorealização e realização de si.

Ser  de uma liberdade situada, ser de decisão, ser do risco e da história, do projecto e da finitude. Ser humano, ser pensante. Cada Eu.

[01] Lugares do Mundo, Brugge

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Mais de uma década depois, voltar a Brugge, a Veneza do Norte, é reencontrar quase tudo na mesma. E voltar ao largo dos 4 cavaleiros do Apocalipse.

Aqui, os cavalos não teêm as tradicionais cores – branco, vermelho, preto, amarelo.
Continuam a representar a Guerra, a Fome, a Morte, a Peste.

Poesia, sempre…

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“Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão.
Porque os Outros têm medo mas tu não.

Porque os Outros são túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.

Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.

Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.

Sophia de Mello Breyner Andresen
Imagem: The human condition, R. Magritte

do fim de vida

 

A morte faz parte da vida e é imperativo conferir qualidade e dignidade ao processo de morrer. Nos últimos tempos foi-se tornando claro que há muito a fazer do ponto de vista do acompanhamento e dos cuidados, quando nada existe a fazer do ponto de vista do tratamento e cura. Neste contexto, o objectivo dos cuidados de saúde é paliar, obter melhor qualidade de vida e preservar, não a integridade corporal ou a saúde, mas a dignidade humana.

Associados ao Fim de Vida, surgem temáticas como a eutanásia, a distanásia, a decisão de não reanimação.  Que precisam de ser distinguidas, sendo que:

eutanásia: a acção que tem como primeira e principal consequência a interrupção deliberada da vida de alguém, que se encontra próximo da morte ou numa situação irreversível, e que pede a morte;

distanásia:  o prolongamento do tempo de morrer, através da utilização de meios de tratamento desproporcionados ou inúteis. Alguns autores utilizam o conceito de “encarniçamento terapêutico” ou “obstinação terapêutica”;

abstenção de terapêuticas inúteis ou desproporcionadas: a decisão de não iniciar ou de interromper tratamentos que não trazem benefício para o doente e que, pelo contrário, implicam desconforto e sofrimento. A grande questão que pode ser colocada é a de saber o que é de facto inútil e como medir os riscos e benefícios.

Frequentemente, esta questão prende-se com a decisão de iniciar, ou não, manobras de reanimação cardiorrespiratória em doentes graves – e leva-nos à reflexão sobre a decisão de não reanimar. A morte é hoje definida como a cessação irreversível das funções do tronco cerebral, sendo que a paragem da função cardiocirculatória e respiratória, por si só, não significa a morte de uma pessoa, já que essas funções podem ser artificialmente substituídas, como acontece frequentemente. A necessidade do estabelecimento de limites coloca-se com maior acuidade quanto mais meios existem, ou, como diria um dos pensadores nacionais da Bioética, nem tudo o que é tecnicamente possível, é eticamente adequado.

 

Na Temperamentvm, REVISTA INTERNACIONAL DE HISTORIA Y PENSAMIENTO ENFERMERO, que já por aqui referi,

Pela mão de Ricoeur e Arendt:história e identidade. A propósito da memória histórica.

A navegação pela memória, feita por Paul Ricour em La mémoire, l’histoire et l’oubli, reúne a fenomenologia da memória, o percurso epistemológico e a hermenêutica da condição histórica – em comum, estão a problemática da representação do passado, que se descobre exposta ao esquecimento, e, simultaneamente, confiada à sua guarda, assim como o enigma de uma imagem, de um “eikon que se dá como presença de uma coisa ausente marcada pelo selo do anterior”.Encontramos o risco de prevalência do “império do esquecimento” dividido entre a ameaça do apagamento definitivo e o seguro dos recursos da anamnese.

Para o que ora nos importa mais, a memória desenha a capacidade de lembrar pelo que se relaciona aos poderes de base do sujeito, como o de falar, de agir, de narrar, de ter-se por autor dos seus actos; por tal nos reenvia para uma antropologia do sujeito. E sendo que “não ter-se esquecido é o poder de recitar sem ter de reaprender”, esboçando-se uma ligação à pedagogia da memória, ao nível ético-político assume um dever duplo que se reúne em forma de futuro e de imperativo, de ambição de veracidade e de uso prático.

O esquecimento (do qual decorre a futilidade) foi abordado, por Ricour, de uma forma particular, como “um atentado à fiabilidade da memória (…), uma falha, uma lacuna”.Na abordagem do nível ético-político da memória, Ricour considera o dever de memória como imperativo da justiça; aliás, o seu discurso sobre a memória traça “duas linhas paralelas”: a da ambição verídica da memória (da fidelidade epistémica da lembrança) e a da utilização prática da memória (visível na técnica de memorização).

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