“São só precisos dez anos para as democracias se transformarem em despotismo”, John Keane

“A característica trágica da democracia é que é muito difícil de construir e muito fácil de ser destruída”. John Keane

Artigo da revista Visão , 6 novembro

“Se pensa que a democracia nasceu em Atenas, na Grécia Antiga, não está sozinho. Esse é um erro comum que muitos repetem e que John Keane, professor de Política na Universidade de Sydney e no Wissenschaftszentrum Berlin, desmistifica. Na verdade, a democracia foi importada do Médio Oriente – Síria, Iraque e Irão, onde foram encontradas as primeiras experiências de autogoverno dos povos. Em Breve História da Democracia, o historiador e cientista político leva-nos numa fascinante e atribulada viagem desde os primórdios da democracia, através de quatro milénios e três fases de evolução – assembleia, representativa e monitorizada –, até aos dias de hoje, em que está seriamente ameaçada.

Porque importa estudar a história da democracia?
O zeitgeist é propício para se estudar a democracia. Infelizmente, estamos a viver um período na Europa, na América do Norte, na América Latina, em algumas partes de África e na Ásia Central em que há uma sensação de que a democracia é uma espécie ameaçada. Esta impressão chega-nos através de notícias: pestilência, guerra, crise financeira e económica…

E tudo isto soa um pouco a déjà-vu
Sim, isto parece uma repetição do que aconteceu nos anos 20 e 30 do século passado, mas eu tento explicar que uma das razões para pensar de forma histórica acerca da democracia é que o presente não é uma repetição desse período de Hitler e Estaline. Há várias inovações que aconteceram entretanto e que contribuem para um maior escrutínio.

Quando olhamos para a história da democracia, percebemos que este não é um processo fluido de evolução em direção à perfeição, mas antes uma montanha-russa com altos e baixos, avanços e recuos.
A democracia tem um espírito fugitivo. Está sempre em movimento. Tem uma qualidade rebelde de fazer variações. A democracia é uma forma de lidar com o poder e de estar no mundo que disrompe com hierarquias de poder onde quer que elas existam, seja nas famílias, nas comunidades locais, nas cidades, em Estados e ao nível internacional. Não há uma lei de ferro da democracia, não há uma evolução histórica em direção ao seu avanço. Francis Fukuyama cometeu um sério erro ao anunciar, em 1989, o fim da História com a vitória global da democracia liberal ao estilo norte-americano. A democracia não é figurável nem facilmente etiquetada; é uma forma de gerir o poder e de viver em conjunto onde há surpresas e disrupções.

Então, o que inclui o conceito de democracia?
Significa autogoverno das pessoas através dos seus representantes escolhidos livremente. Tem mudado historicamente, assume várias formas, mas o que permanece é a recusa do poder arbitrário, do poder de alguns decidirem pelos outros, forçando-os a viver de uma forma que não escolheram. A democracia é o inimigo do poder arbitrário e, neste sentido, é a ideia política e o ideal mais radicais que nós, humanos, inventámos até agora.

E é radical porque é contrária à “natureza humana”, com aspas, porque este é também um conceito difícil de encaixar numa definição? 
A democracia é um amigo da contingência. Quando o seu espírito e as suas instituições se enraízam num certo contexto, a democracia sensibiliza as pessoas, dá-lhes a sensação de que as coisas podem ser alteradas, que o que é considerado natural não é necessariamente assim, e que o que as coisas são hoje não é automaticamente o que serão amanhã. Isso vê-se no desfecho de umas eleições… não sabemos quem governará Portugal daqui a uns anos, se Joe Biden será reeleito ou se aquele homem loiro regressará à Casa Branca. Há esta sensação de que as coisas podem ser alteradas, e que há coisas que se tornam ilegítimas. Alexis de Tocqueville, o aristocrata francês que visitou os Estados Unidos da América nas primeiras décadas do século XIX, foi um dos primeiros a perceber que a democracia desnaturaliza o poder. Ele observou que, na jovem república americana, a desigualdade entre homens e mulheres, considerada natural e concedida por Deus, não sobreviveria ao que ele chamava revolução democrática. E estava convencido de que a escravatura, em que parte da democracia assentava, poderia também não sobreviver, porque era incompatível com o princípio da igualdade subjacente. A democracia assenta na igualização de oportunidades de vida e no desmantelamento de hierarquias de poder, onde quer que existam. O pequeno livro de Saramago O Conto da Ilha Desconhecida é uma excelente alegoria que capta bem estas dinâmicas de contingência e de movimento em direção a algo que não pensávamos ser possível.

Quando olhamos para o modo como as democracias morrem, há causas comuns de degradação: a desilusão e o ressentimento dos cidadãos, o gap cada vez maior entre pobres e ricos, guerra, destruição ecológica, fenómenos climáticos extremos…

As democracias assentam também num forte sentimento de esperança? As pessoas organizam-se em democracias se acreditam que isso lhes trará qualquer coisa melhor. E o que acontece quando se perde a esperança? 
Tem razão: a democracia transporta a esperança de que as pessoas de carne e osso são suficientemente boas para se governar a si próprias, e tem por base o medo de o poder concentrado nas mãos de um monarca tirano ou um ditador ser usado de modo abusivo. Quem não gosta de democracia tem de acreditar que o poder é benevolente. E, na sua história, a democracia é uma forma política de recusar essa forma de pensar, que não passa de uma crença desejável. Quando a esperança foi substituída por outros sentimentos, muito frequentemente, na sua história, a democracia enfraqueceu. Por exemplo, o ressentimento contém uma certa raiva e inveja das pessoas que não são poderosas; é muito perigoso. É um dos combustíveis desta nova vaga de populismo que está a varrer a Europa, a América latina e, claro, os Estados Unidos da América. O ressentimento contém vários sentimentos raivosos de que as coisas têm de mudar porque há injustiças e porque as nossas vidas não estão a melhorar. As pessoas sentem-se “tramadas” pelo sistema rico e poderoso, que sentem que está a manipulá-las. Como vemos na Hungria, nos EUA com Trump e repetidamente na América latina, o populismo e o ressentimento que o alimenta tipicamente têm consequências antidemocráticas. Produzem demagogos, uma enorme ameaça para as democracias. A esperança, a crença de que as coisas podem mudar e que é possível fazer estas mudanças, é mesmo um fluido vital da democracia. E isso não se confunde com utopia ou com crenças sem fundamento.  

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Quando a esperança foi substituída por outros sentimentos, muito frequentemente, na sua história, a democracia enfraqueceu. O ressentimento é perigoso, é um dos combustíveis desta nova vaga de populismo.

gestos de alerta

O gesto foi difundido o ano passado, lançado pela Women’s Funding Network, nos EUA, em parceira com a Canadian Women’s Foudation, durante os primeiros dias da pandemia, para ajudar a enfrentar o aumento da violência doméstica, durante o confinamento.

Consiste em colocar a palma da mão para cima com o polegar virado para o centro e, de seguida, fechar os restantes quatro dedos sobre o polegar. Desta forma, as pessoas podem alertar, silenciosamente, um membro da família, amigo, colega de trabalho e, até, desconhecidos, durante uma chamada de vídeo, foto ou ao abrir a porta, para o perigo que está a correr.

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Dias ecuménicos

https://worldinterfaithharmonyweek.com/

No terceiro  domingo de janeiro (neste ano, dia 16) celebrou-se o Dia Mundial da Religião, que surgiu em 1949 com o intuito de promover a união das religiões existentes no mundo. É uma das formas de apelar ao diálogo inter-religioso, um momento ecuménico para promover a convivência, o interconhecimento e o diálogo.
Portugal é considerado um país exemplar no que diz respeito à tolerância religiosa mas isso não acontece em muitos outros países. Por exemplo, o Brasil instituiu, em 2007, o dia 21 de janeiro como o  Dia de Combate Nacional à Intolerância Religiosa para dar visibilidade à intolerância religiosa e reforçar o direito do livre exercício da religião, seja ela qual for.
Com início a 1 de fevereiro de 2022, decorrerá, sob a égide das Nações Unidas, a World Interfaith Harmony Week (Semana Mundial de Harmonia Inter-religiosa). É importante agir para um futuro mais livre de preconceito, discriminação e intolerância.

medida interessante…

A medida é interessante se bem que a frase-chave me pareça não-tão-feliz.

Condições da campanha

1. Oferta do livro:
De 14 a 18 de junho, quem fizer uma dádiva de sangue num dos locais de coleta do Instituto Português do Sangue e da Transplantação, receberá um vale oferta que pode trocar por um livro em wook.pt. Confirme aqui os locais onde pode dar sangue.

2. Condições do Vale de oferta:
Código de oferta válido até às 24h00 do dia 30 de junho de 2021, aplicável numa seleção de livros
Cada código/vale corresponde à oferta de apenas 1 livro. Não reembolsável nem convertível em dinheiro.
Limitado ao stock existente. Os livros anulados ou devolvidos pelo cliente (exceto erros de impressão ou danificados) não poderão ser substituídos. Em caso de rutura de stock, a WOOK reserva-se o direito de substituir o livro selecionado por um semelhante.

Suicídio assistido – 11º estado dos EUA

Suicídio ajudado ou assistido refere-se a uma pessoa que decide pôr termo à vida, encontrando-se numa condição de doença irreversível, sendo competente, capaz de decidir sobre si, não sofre de distúrbio depressivo ou psiquiátrico, realizou processo de deliberação, expressa vontade e determina-se a realizar o ato, cumprindo os requisitos formalmente estabelecidos. A pessoa que ajuda coloca recursos à disposição, seja informação, seja os meios para a concretização, não intervém na decisão (não induz, persuade ou incentiva) e a morte não decorre diretamente da sua ação.

Nos Estados Unidos, o primeiro Estado foi Oregon (1997, lei aprovada em referendo popular e designada por Death With Dignity Act), depois, Washington DC (desde 2008, após consulta popular referendária); Vermont (2013, por lei denominada End of Life Choices Act), depois California (2015, através da aprovação da lei chamada End of Life Option Act), Colorado aprovada lei em 2015, com efeitos em 2016, Columbia 2017, Hawaii 2018, New Jersey 2019, Maine 2019, New Mexico em 2021.

California (End of Life Option Act; approved in 2015, in effect from 2016)

Colorado (End of Life Options Act; 2016)

District of Columbia (D.C. Death with Dignity Act; 2016/2017)

Hawaii (Our Care, Our Choice Act; 2018/2019)

Maine (Death with Dignity Act; 2019)

New Jersey (Aid in Dying for the Terminally Ill Act; 2019)

New Mexico (Elizabeth Whitefield End of Life Options Act; 2021)

Oregon (Death with Dignity Act; 1997)

Vermont (Patient Choice and Control at the End of Life Act; 2013)

Washington (Death with Dignity Act; 2008)

State Navigator

link

“New Mexico has become the 11th American jurisdiction with assisted suicide.On Thursday, Governor Michelle Lujan Grisham signed the Elizabeth Whitefield End-of-Life Options Act. “Dignity in dying — making the clear-eyed choice to prevent suffering at the end of a terminal illness — is a self-evidently humane policy,” said Lujan Grisham.

The new law takes effect on June 18. It will permit terminally ill patients with six months or less to live to request lethal medication. The diagnosis must be agreed upon by two medical experts, and the patient must pass a mental competency screening. After a 48-hour waiting period, they could take their own lives. They must take the lethal prescription themselves.

The US jurisdictions where assisted suicide is now legal are: California, Colorado, District of Columbia, Hawaii, Maine, New Jersey, New Mexico, Oregon, Vermont and Washington. In Montana, a state supreme court decision permits doctors to assist suicides with impunity, but it has not been legalised by statute.

According to AP, New Mexico is the second state after New Jersey with a third or more of its population identifying as Catholic which has chosen to legalise assisted suicide.”

em consulta pública

PRR – Plano de Recuperação e Resiliência
Consulta Pública até 1 de março…

“O PRR é de aplicação nacional, com um período de execução até 2026, com recursos que ascendem a cerca de 14 mil M€ de subvenções, um conjunto de reformas e de investimentos que permitirão ao país retomar o crescimento económico sustentado, reforçando assim o objetivo de convergência com a Europa ao longo da próxima década.

Com base no diagnóstico de necessidades e dos desafios, o PRR foi organizado em três dimensões estruturantes: a Resiliência, a Transição Climática e a Transição Digital.

Estas dimensões são concretizadas através de 19 Componentes que integram por sua vez 36 Reformas e 77 Investimentos.”

há cada disparate…

Então não há quem pergunte – Em Portugal “20% das vacinas vão para o lixo devido à falta de seringas adequadas”?

Trazido do Polígrafo (o jornal português de Fact-Checking)

segundo os dados apresentados pelo Ministério da Saúde, a taxa média de aproveitamento da vacina é de 5,8 das seis doses contidas num frasco. Assim, o desperdício médio corresponde a 0,2 das doses. Ou seja, regista-se um desperdício de 3,3%, percentagem muito distante dos 20% mencionados na publicação.

Ao Polígrafo, a Administração Regional de Saúde do Centro (ARS Centro) também desmente a acusação de Jaime Ramos. “É totalmente falsa a existência de um desperdício dessa grandeza, existe de facto uma questão sobejamente identificada, mas nem sempre devidamente esclarecida, sobre o aproveitamento da sexta vacina da Pfizer que depende mais da técnica de extração do que apenas das seringas”.

papel selado e selos fiscais

Cruzei-me, no Cachimbo de Milho, com esta imagem e o título “papel selado e selos fiscais”

E logo me vieram à lembrança os muitos usos deste papel selado e do azul de 25 linhas e a compra dos «selos fiscais», coisas de outros tempos, em que vigorava o «imposto do selo», com valores diferentes da estampilha conforme os fins, e que os mais novos nem fazem bem ideia do que fossem.

A utilização do selo como meio de obtenção de receitas públicas terá ocorrido no primeiro quartel do século XVII.

Na Holanda surgiu o papel timbrado com o carácter fiscal e aplicava-se a todos os atos, contratos, atestados, certificados, registos etc. Em Espanha, no reinado de Filipe IV, o primeiro diploma que instituiu o uso de valores selados sob forma de quatro tipos de papel selado, data de dezembro de 1636. Em Portugal, o imposto do selo surgiu com a regência de D. Luísa de Gusmão, no regulamento de 24 de setembro de 1660 e a receita destinava-se a cobrir as despesas da guerra contra Castela (Restauração). Na Inglaterra, o uso de papel selado com finalidade tributária ocorreu em 1671. Em França, o papel selado surgiu com característica fiscal a 19 de março de 1673, no reinado de Luís XIV, e aplicava-se nos julgamentos e atos notariais. Na Itália, os valores selados foram regulamentados com caráter fiscal em 1862.

Recordo-me bem que todos os requerimentos dirigidos a organismos oficiais tinham de ser escritos em papel selado, que só podia ser comercializado pelo Estado e que se vendia nas Repartições de Finanças e vendedores autorizados. O preço desse papel, caríssimo, constituía o imposto. E dizia-se que o papel era selado porque tinha impresso um selo de autenticação em relevo. Para outros documentos (recibos de salários, recibos de renda, etc., todos sujeitos a imposto) havia uns selos, os selos fiscais, semelhantes aos selos postais, que eram colados nos documentos para comprovar o pagamento do imposto respetivo.

A extinção do papel selado aconteceu em 1986 e da estampilha fiscal, pouco tempo depois. Mas o imposto do selo permanece – regime previsto na Lei nº 150/99 de 11 de setembro, Código do Imposto do Selo, sendo que a reforma 2003 alterou o âmbito de incidência objetiva deste imposto,incluindo as transmissões gratuitas dos bens.

:)

viés(es) de cognição: Dunning-Krueger e Backfire

De há uns tempos para cá, pareceu-me que aumentou a difusão do efeito Dunning-Krueger – pelo menos, houve alguma divulgação nas redes sociais.

O efeito Dunning-Kruger é um fenómeno que leva indivíduos que possuem pouco conhecimento sobre um assunto a acreditarem saber mais que outros mais bem preparados ou mesmo especialistas, fazendo com que tomem decisões erradas e cheguem a resultados indevidos. E é a sua incompetência que restringe a sua capacidade de reconhecer os próprios erros. Estas pessoas sofrem de superioridade ilusória. O mecanismo da ilusão de superioridade foi demonstrado numa série de experiências realizadas por Justin Kruger e David Dunning, da Universidade de Cornell. Os resultados foram publicados no Journal of Personality and Social Psychology em dezembro de 1999. Constataram que “a ignorância gera confiança com mais frequência do que o conhecimento”.

Os psicólogos Justin Kruger e David Dunning concluíram que: os incompetentes não conseguem reconhecer a sua incompetência, podendo passar a acreditar que são injustiçados por não conseguirem os resultados esperados; os incompetentes não são capazes de reconhecer a competência em outros indivíduos, pois tendem a acreditar que são os mais inteligentes no grupo em que se encontram; a incompetência retira aos indivíduos a capacidade cognitiva de perceber que não têm conhecimento numa área específica. O incompetente não tem exatamente o que precisa para saber que nada sabe. Os indivíduos que sofrem do efeito Dunning-Kruger podem reconhecer e aceitar que eram incompetentes se passarem por um processo de qualificação e adquirirem conhecimentos. (post no FB)

Mas tão relevante como este viés de cognição, é outro designado «backfire», ou o tiro pela culatra. Desafios às crenças das pessoas podem levá-las a acreditar nelas de modo ainda mais forte. De onde, a tentativa de correção de uma crença incorreta “sai pela culatra” (o efeito backfire) e as pessoas ficam ainda mais convictas sobre algo que acreditavam ser verdade. É caso para dizer que «é pior a emenda que o soneto».

registo em duas línguas: situação do setor dos espetáculos

“Vestem preto para ser discretos. Sem eles não há espetáculos”. A situação dos técnicos, roadies e demais profissionais do mundo do espetáculo reuniu manifestantes no Terreiro do Paço, em Lisboa. “Queremos um dia voltar” foi o mote do protesto. Na praça ribeirinha da capital, os manifestantes dispuseram as suas flight cases, tendo sido projetadas imagens das salas de espetáculos vazias. O protesto foi convocado pela Associação Portuguesa de Serviços Técnicos para Eventos (APSTE), formada por mais de 140 empresas da área. A falta de trabalho no setor, após o cancelamento de grande parte dos espetáculos devido à pandemia de covid-19, está a deixar muitos dos profissionais desesperados.

Struggling live-event workers protest in Lisbon to save pandemic-hit sector.  by Live event workers protest in demand of more government support amid the coronavirus disease (COVID-19) pandemic in Lisbon, Portugal August