da história

O cronista que narra os acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e os pequenos, leva em conta a verdade de que nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história. Sem dúvida, somente a humanidade redimida poderá apropriar-se totalmente do seu passado. Isso quer dizer: somente para a humanidade redimida o passado é citável, em cada um dos seus momentos. Cada momento vivido transforma-se numa citation à l’ordre du jour — e esse dia é justamente o do juízo final.

Sobre o conceito de história

Walter Benjamin

Pensamento do dia

Pelas colheitas

“Que o nosso grão seja tão abundante que nos esqueçamos dele na terra e o deixemos cair ao longo dos caminhos. Pois tanto e tanto será ele que para o ano que vem quando formos semear, os campos e caminhos estejam já cobertos de trigo que desponta”

Khonds, Índia in Oração dos Homens

(Poemário Assírio & Alvim, 2008)

“Se hoje começasses o blog, chamavas-lhe conversamos?”

Ora aí está uma pergunta discreta e original sobre…  o tempo. Este blog tem nome escolhido há 4 anos, quando ainda era uma página pessoal, com comentadores. Passou a blogspot no dia de Novo Ano de 2005. E mudou-se para o wordpress em Outubro de 2007, de malas e bagagens, ou seja, importanto todo o conteúdo que estava no Blogspot. Continua inteiro, aqui. Com as marcas do tempo e das ideias expostas, até porque, como disse um dia um dilecto vizinho da blogoesfera, o próprio blog ajuda o autor a perceber o que foi mudando no tempo. Até aqui, linear.

Agora, o nome?? Dar nome às coisas é o que os seres humanos fazem quando pensam, claro. Nomear, ao dar nome, é dar existência…Como chamaria eu a este blog, se fosse agora?

Poderia ser Ágora, em homenagem ao sítio onde Sócrates mais falava, espaço público e de cidadania, por excelência  –  mas já é título de duas revistas filosóficas e uns quantos blogues….

Poderia ser Jardim de Epicuro, pois que o filósofo assim ficou conhecido mas já há pelo menos um inspirado na ideia, com nome Garden of Philodemus

Interrogaria Scriptorium, “lugar para escrever”, se fechasse as caixas de comentários. O que nunca fez parte da ideia – aliás, nem moderação de comentários, quanto mais…

Claro que outra hipótese seria Polis, em ligação a Hannah Arendt, uma mulher para quem a filosofia não era saber tudo mas saber de si mesmo como princípio de acesso à liberdade. E a política surge no “espaço entre-os-homens”, ou seja, baseada na relação interpessoal, na convivência entre diferentes e na pluralidade. Em Arendt, a política pode ser entendida como conversar-com-outro-sobre-alguma-coisa-comum, nascida na essência do diálogo.

Ah, outra hipótese seria Diálogos, pela etimologia «dia-Logos», «travessia pelas palavras», ainda que o Logos grego passasse de «palavra» a «razão»; com a vantagem de retomar Sócrates e o método maiêutico.

Porém, o mote comum, ainda assim, e hoje, seria a liberdade (título magnífico de um livro de Stuart Mill) de conversar – ou seja, de enunciar com verso e com reverso, que a ideia de conversar também exige o Outro, que expressa verso ou reverso. Co(n)versar. “uma forma de sociabilidade indispensável para a consistência da vida em comum, dando densidade ao que é viver em sociedade.(….)  Ideia claramente colocada no Amigo do Povo há um ano.

Porque as conversas que se desfrutam continuam as ser dos momentos melhores, dos que discutem o que ocorre ou o que interessa naquela altura, autores, livros, ideias, memórias, coisas… do seu tempo, ao tempo em que aconteceram.
Portanto, a resposta só pode ser que sim, e sublinharia os pontos de exclamação e interrogação.

Quem escreve filosofia

Parecem existir poucas mulheres na Filosofia – é uma constatação simples de fazer. Ou, dito de outra forma, não aparecem muitos nomes femininos que sejam sonantes na história da Filosofia.  Surgem, no século XX, nomes como Hannah Arendt, Simone de Beauvoir, Elisabeth Anscombe, Simone Weil ou Martha Nussbaum.

Mulheres filósofas raras – sem com isto querer dizer que não existiram ou não fizeram sentir as suas influências. E sendo certo que podem apontar-se alguns casos, o desequilíbrio entre os géneros na história da humanidade, parece evidente – por exemplo, citar Damaris Cudworth ou Catharine Cockburn, que se corresponderam com Locke e Leibniz, não faz realmente diferença.

Notar essa falta, serve para relevar Hannah Arendt e Martha Nussbaum que, podendo não ser muito conhecida entre nós, já serviu de referência a um acórdão do Tribunal Constitucional, que, curiosamente, incluiu igualmente Paul Ricoeur e John Rawls.


ACÓRDÃO N.º 617/2006, TRIBUNAL CONSTITUCIONAL – Processo nº 924/2006. O Presidente da República, nos termos do artigo 115º, nº 8, da Constituição e dos artigos 26º e 29º, nº 1, da Lei nº 15-A/98, de 3 de Abril, requereu a fiscalização preventiva da constitucionalidade e da legalidade da proposta de referendo aprovada pela Resolução nº 54-A/2006 da Assembleia da República (publicada no Diário da República, I Série, de 20 de Outubro de 2006).

(imagem: Lady writing a letter, Vermeer)

 

Elos que libertam…

Vindo do Olhar do Miguel

e de Revisitar a Educação

dando continuidade a uma corrente que, paradoxalmente, liberta e enreda: liberta a tensão instigada por um poder político pouco sensível às realidades situadas e, simultaneamente, enreda os actores numa teia de interesses recíprocos.

Agradeço ao Miguel e à Fátima André. E para bem cumprir, esta corrente levar-me-á a destacar sete blogues brilhantes – sem ser os que mo ofertaram, o que apetecia, e não seria por mero acto em espelho…

Que Universidade?, sítio onde o MJM nos mantem informados, e de onde se sai da «Revista da Imprensa» e dos textos, para ir pensando.

A educação do meu Umbigo, Gaveta aberta de textos e memórias a pretexto da Educação que vamos tendo. Onde o passado, o agora e as preocupações com o amanhã se encontram, com música e livros (entre eles, adivinham… PG escolheu um de Arendt 🙂

Polikê, o tom irónico e algumas vezes beligerante, que faz sorrir e pre-ocupa, onde RN consegue sempre surpreender…

Retórica, que já foi “e Persuasão”, onde leio AS e os escritos de traços ora críticos, ora indulgentes, rearmados de ética e do homem.com

Directriz, que vou lá pé ante pé, e trago, graças a RFS, o olhar com imagens magníficas ou os sons a bailar no ouvido.

Psikiatrices, que convida a pensar áreas próprias e em tom pessoalissimo.

Aprender e ensinar, onde alguém preocupado com o ensino expande as leituras que faço e com mão amiga traz novos autores ao meu horizonte.

Agradeço a estes, que me apraz relevar, e a muitos outros, os momentos de reflexão ou contemplação que me têm proporcionado.

Se daqui se pudesse votar….

If the world could vote…

November 4th 2008 the American people will choose a new president. The president of the United States of America is the most powerful person in the world.

We would like to know who would be the next president of the United States of America – if the world could vote!

In the presidential election in 2004 122,267,553 people voted. 6,500,000,000 people did not.

Our mission is to get more people to vote than voted in the last election. Mission impossible, we know, but still, wouldn’t it be great to see what the whole world thinks?

If we are to have any chance of reaching that goal we need your help. Tell all your friends around the world about iftheworldcouldvote.com. You can send them email, share it on Facebook (we also have a group you can join), digg it, reddit, save to delicious … Or all of it. So go ahead. Let’s see who would be the next president of the United States of America – if the world could vote;)

Uns “internautas” da Islândia decidiram criar este site.

Quem viu no blog “Bitaites”, enviou-me (obrigada, CG) – já votei.

Não deixe de ver a distribuição pelos países do mundo 🙂

vale acrescentar adendas a post’s?

Ao post Do ensino superior e dos híbridos, relendo o comentário de JNA e olhando em redor, apetece(-me) acrescentar….

Talvez este seja uma espécie de momento híbrido – em que se pretende modificar as práticas que remanescem ligadas ao passado, se tem ideias e aspirações para o futuro, mas muitos contrangimentos se colocam. Incluindo os dos hábitos e os dos financiamentos.
Mais que o momento, ou uma fase, pode até vir a ser um paradouro. Ou seja, pode até vir a decidir-se que as dissonâncias têm efeitos benéficos, «de um certo ponto de vista», e, risco maior, decidir ficar assim.
O discurso das metodologias activas, dos grupos pequenos (pois, tutorias) é curioso, para dizer o mínimo, com os ratios a argumentarem objectivamente contra.

Hoje,  Publico Online informa que “Portugal é o país da União Europeia que, ao nível do 2.º ciclo do básico, dedica menos tempo ao ensino da língua e da Matemática. No 3.º ciclo (7.º, 8.º e 9.º anos) apenas a Holanda apresenta uma percentagem da carga horária inferior.”

O relatório “Education at a Glance 2008” (OCDE) evidencia este prejuízo da matemática e da língua materna. Do pensamento abstracto, portanto (e da língua que sendo a de expressão-mãe é maltratada em sms e MSN até ficar reduzida a consoantes e vogais apenas oralizáveis).Nos slides, de acesso rápido, lê-se acerca do aumento da procura das qualificações (57% ao nível d ensino superior), fortalecimento do mercado de trabalho e a pressão do financiamento.

Temos uma frequência de doutoramentos de 7,2% contra a média da OCDE de 2,8% – e coloque-se, ao lado, a escassa qualificação geral da população. Eventualmente, no Education at a Glance 2009, Portugal colherá os números das novas oportunidades, da recução do insucesso escolar e da banalização o doutoramento. E saberemos cada vez melhor que números, ainda assim, não bastam.

E depois, tropeçamos noutros números, a toda a hora. Os euros. Diz a RN:

“Assim, meus caríssimos e raríssimos leitores, haverá não um acréscimo mas um decréscimo. Mas, enquanto se anunciou um acréscimo e de 40%, possibilitou-se um significativo remanejamento das atribuições financeiras às diferentes instituições, entre as quais serão francamente beneficiadas as candidatas a fundações – UAVEIRO, UPORTO e ISCTE . A única boa notícia parece então resumir-se ao facto de ter HIPOTETICAMENTE desaparecido o famigerado factor de coesão. Entretanto, entre as Estatísticas, percentagens, erros, favorecimentos e factos, o que permanece imutável, são os 360º de Liberdade deste Ministério.

Estranho só as choradeiras e mal dizer, sem nunca haver alguém, do CRUP ou do CCISP, a pedir OFICIALMENTE que as contas minesteriais sejam conferidas.

Este Ministério lembra-me sempre a minha avó materna – perguntava magnânima e secretamente a cada um dos netos de quanta mesada precisava, e depois entregava ao mais velho um décimo do que tinha pedido o menos ambicioso de nós, e dizia-lhe para repartir, responsavelmente, esse valor por todos – éramos e, felizmente, ainda somos 5. Nunca soubemos , nesses tempos, nem os planos, nem as dotações nem as execuções financeiras uns dos outros.”

Uma avó vanguardista, teve a autora do Polikê?. Que ás vezes, antevê-se o futuro…

Poema do dia

Não sei
se respondo ou se pergunto.
Sou uma voz que nasceu na penumbra do vazio.
Estou um pouco ébria e estou crescendo numa pedra.
Não tenho a sabedoria do mel ou a do vinho.
De súbito ergo-me como uma torre de sombra fulgurante.
A minha ebriedade é a da sede e a da chama.
Com esta pequena centelha quero incendiar o silêncio.
O que eu amo não sei. Amo em total abandono.
Sinto a minha boca dentro das árvores e de uma oculta nascente.
Indecisa e ardente, algo ainda não é flor em mim.
Não estou perdida, estou entre o vento e o olvido.
Quero conhecer a minha nudez e ser o azul da presença.
Não sou a destruição cega nem a esperança impossível.
Sou alguém que espera ser aberto por uma palavra.

António Ramos Rosa

(foto aqui)

efeméride do dia: grito de independência e revolta


No dia 14 de Agosto de 1822, D. Pedro viajou para São Paulo para resolver um problema político. Deixou no poder, durante  a sua ausência, D. Leopoldina, sua esposa. Entretanto, chegaram ao Rio de Janeiro ordens das Cortes: D. Pedro deveria voltar imediatamente a Portugal. D. Leopoldina enviou os mensageiros com essas notícias – um mensageiro encontrou-se com D. Pedro nas margens do rio Ipiranga, em São Paulo.

Era a tarde do dia 7 de Setembro de 1822. D. Pedro terá desembainhado a espada e gritado «independência ou morte».Ficou, para a história, o “grito do Ipiranga”.

Em abono do rigor, duas vezes foi chamado nesse ano, pelas Cortes de Lisboa. Por duas vezes, o príncipe negou-se a regressar. A primeira vez, em Janeiro, tornou-se conhecido como «o Dia do Fico» (porque afirmou, «eu fico»). A segunda, o Grito do Ipiranga. Em Outubro seria proclamado Imperador. Diz-se que teria seguido o conselho do pai: «Se um dia o Brasil tiver de separar-se de Portugal, cinge tua cabeça com a coroa, antes que um qualquer aventureiro se apodere dele».

Proclamado Imperador a 12 de Outubro e coroado solenemente a 1 de Dezembro desse mesmo ano, D. Pedro I transformou o Brasil numa monarquia constitucional. Eventualmente menos esperado virá a ser o  decréscimo do carisma com que iniciara o reinado – tanto assim que em 1831 abdica a favor do filho (então com 6 anos) e regressa a Portugal. A seguir, lutará contra D. Miguel, seu irmão… mas essa é outra história.

Até hoje, na linguagem comum, entende-se o Grito do Ipiranga como um brado de independência e de revolta.

(imagem aqui)

da vida

Uma das coisas que custa em presença da morte talvez seja a incapacidade de consolar: o que dizer? o que fazer? como simplesmente estar?
Perante a morte de alguém –  que conhecemos e de quem gostamos ou que é significativo para alguém que conhecemos e de quem gostamos – reconhecemos como somos frágeis e como desperdiçamos o nosso tempo – de maneiras fúteis, com coisas pequenas, ou como, tantas vezes temos as prioridades do avesso.

A morte faz parte da vida e não deixa de ser curioso que apareça a lembrar que a vida é precaridade pura.

(Water Lilies, Monet)